Nesta época de festivais de música, concertos ao ar livre, noites quentes em bares ou simplesmente nas nossas casas (a ouvir música); nada melhor do que reflectir acerca de algumas questões relacionadas:
- Porque é que gostamos tanto de música?
- Porque é que a música é tão importante em todas as sociedades, culturas e ao longo das épocas?
- Qual a sua função?
Um dos investigadores que mais se tem dedicado ao estudo desta área chama-se Daniel Levitin, um neurocientista da McGill University em Montreal. Muitos dados que aqui vos trago são da sua autoria.
O Daniel Levitin tem uma história interessante de vida: é originário de São Francisco, onde nasceu em 1957, inicialmente estudou engenharia electrónica e música. Nos anos 70 acaba por deixar os estudos para se dedicar a ser músico e produtor musical, atingindo bastante sucesso nesta área. Aos seus 30 anos decide voltar aos estudos e tirar o curso de Psicologia e Ciências cognitivas na Stanford University. Posteriormente decide dedicar-se a ambas as paixões: a neurociência e a música. Tornou-se um famoso neurocientista que se especializou no estudo dos efeitos da música a nível cerebral, escreveu um livro intitulado “This Is Your Brain On Music: The Science of a Human Obsession“, que eu ainda não li, mas que estou cheio de vontade de ler!
Mas vamos voltar ao caminho e tentar responder às perguntas…
Neste momento aconselho escolher uma música da sua preferência enquanto lê este texto (para por as coisas em prática!). No entanto vou deixar uma da minha preferência para os mais preguiçosos.
Porque é que gostamos tanto de música?
Já antes, num artigo deste blog intitulado “Música e dopamina“, tinha escrito acerca do efeito que a música produz no cérebro através da libertação de dopamina e que leva a sensações de prazer, euforia e aumento da energia.
Mas outra pergunta é: porque gostamos de determinadas músicas ou géneros musicais? O Daniel Levitan e colaboradores investigaram isto. Chegaram à conclusão que quanto mais estimulação determinada música provoca no nucleus accumbens (área cerebral responsável pela formação de expectativas) maior a possibilidade de gostar de determinada música. Outra área do cérebro, o giro temporal superior (que está intimamente ligada nucleus accumbens), é também importante e está relacionado com algo a que podemos chamar “educação musical“. A sua formação depende da música que foi ouvida durante a vida, funcionando como um armazenamento da “memória musical”, por exemplo, alguém que tenha ouvido muito jazz ao longo da vida tem maior probabilidade de gostar de um trecho de jazz que nunca tenha ouvido.
No fundo o nosso cérebro funciona como uma espécie de “motor de recomendação musical”!
Porque é que a música é tão importante em todas as sociedades, culturas e ao longo das épocas?
Muito acontece no nosso cérebro quando ouvimos música. Estudos mostram que áreas cerebrais envolvidas no movimento, memória, atenção e planeamento, ficam activas quando estamos a ouvir música. Portanto, passa-se muito mais no cérebro do que simplesmente “processar música”.
Outra coisa interessante que se verifica é o seguinte: não é natural sentirmo-nos confiantes e bem no meio de uma multidão de 20 ou 40 mil pessoas, pois não? Mas na realidade isso acontece quando estamos num festival ou num concerto musical! A música parece ter uma função importante: a de unir as pessoas! Algo que dificilmente se encontra noutras formas de arte.
A música tem uma capacidade única de acordar emoções, despertar memórias (quantas vezes ouvir determinada música nos lembra de umas férias, de um amigo, de uma altura da nossa vida?) e intensificar experiências sociais. Isto está relacionado com algo a que chamamos neurónios espelho (que se pensa terem como função permitir ao indivíduo compreender o significado e intenção de um determinado sinal comunicativo – ver este artigo para mais detalhes).
Talvez isto ajude a explicar a sua importância e universalidade em inúmeras culturas e épocas.
Qual a sua função?
Muitas vezes a música é comparada à linguagem, é também uma forma de comunicação e muitos dos componentes cerebrais activos nestes processos são os mesmo. No entanto, a primeira é muito mais “misteriosa”, de facto a sua razão de ser permanece no fundo desconhecida. A música não têm nenhuma utilidade óbvia, é difícil de definir (todos sabemos o que é música, mas conseguiremos mesmo por limites necessários para uma definição?). Como explicar então a sua universalidade e manutenção ao longo do tempo?
Como vimos antes a música facilita a interacção entre grupos, pondo-os “em sintonia”. Por isto, pensa-se que poderá ter um papel importante na sociedade como factor de coesão e organização da nossa arquitectura social! E há inúmeros exemplos históricos de lideres (de nações, políticos, religiosos, etc.) que compreenderam e utilizaram este poder para influenciar populações.
Recentemente, neurocientistas mostraram que a música ajuda na aprendizagem, na formação de memórias, no controlo de estados de ansiedade e mesmo na organização do conhecimento.
A música (tocar ou ouvir) tem também importantes funções na neuroplasticidade cerebral (ver este artigo do blog), ou seja não deixa “enferrujar o cérebro”.
Isto são algumas das funções encontradas para a música, mas o mistério persiste… e ainda bem porque a vida sem mistérios não tem piada nenhuma!
Fico por aqui e recomendo a página do Daniel Levitin: http://daniellevitin.com, que disto sabe muito mais que qualquer outro!
Abraço e… boas músicas sempre!
DG 2013








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